Autor fala sobre processo de escrita da obra, sensação de ser premiado com o Jabuti e suas referências
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por Adriano Alves
Foi observando um pé de maracujá em duas fases, ainda vivo e depois morto, que Luís Osete iniciou seu livro “Maracujá Interrompida”. A obra, que reflete sobre luto, memória e renascimento, recebeu o Prêmio Jabuti 2025, na categoria Eixo Inovação – Escritor Estreante (Poesia).
Abaixo compartilhamos uma breve entrevista  com o jornalista e escritor baiano. Natural de Cardeal da Silva (BA) e radicado no Vale do São Francisco, ele nos deu detalhes do processo da obra, além de falar da sensação de vencer a premiação e suas referências de leitura.
CULTURAMA -  Como surge o livro “Maracujá Interrompida”? São palavras colhidas de que pé?
LUÍS OSETE - Maracujá Interrompida surgiu de um tempo de silêncio e de espera. Entre 2020 e 2021, morei novamente com meus pais, em Cardeal da Silva, minha cidade natal, durante os meses mais críticos da pandemia. No quintal da casa, havia um pé de maracujá que se tornou um refúgio e uma companhia. Eu me sentava ali todos os dias, observando o ritmo da natureza e o nascimento das flores a partir do casulo, como quem busca um respiro poético no meio do luto coletivo que atravessávamos.
Um dia, cheguei ao quintal e soube que meu pai havia cortado o pé de maracujá. Senti uma tristeza profunda, mas não reclamei, não disse nada. Continuei indo ao quintal, observando o que acontecia com aquele pé morto, registrando o que via e sentia. E, nesse gesto de permanecer, começaram a brotar as histórias das mulheres que atendi anos antes, quando estagiava como psicólogo na atenção básica, em Petrolina, muitas delas vítimas de violência doméstica. Essas vozes voltaram a mim com força. Trouxeram lembranças, dores e também aprendizados sobre afeto, coragem e resistência. 
O livro é, portanto, feito de palavras colhidas de um pé interrompido: o maracujá morto no quintal e as histórias interrompidas dessas mulheres, que continuaram florescendo em mim de outro modo. Ao longo da escrita, muitas referências literárias que me formaram também se entrelaçaram a essas vozes, autoras e autores que me ensinaram a transformar a escuta em gesto de criação. 
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Você nasceu em Cardeal da Silva (BA) e viveu entre Juazeiro (BA) e Petrolina (PE). Como esses territórios estão presentes na sua escrita?
Os territórios onde vivi estão entranhados na minha escrita, não como paisagens, mas como modos de sentir e de me relacionar com o mundo. Cardeal da Silva é o ponto de partida: o quintal e a infância, o lugar das primeiras imagens e lembranças, dos primeiros silêncios e esquecimentos. Já Juazeiro e Petrolina me formaram de maneiras muito distintas. Tenho a sensação de que Juazeiro é pra fora: é a rua, o movimento, o rumor da vida cotidiana, o espaço do olhar e da escuta do mundo. Petrolina, ao contrário, é pra dentro: é o recolhimento, o tempo do silêncio e da elaboração. Acho essa complementaridade a grande riqueza de viver nesse trânsito entre as margens, nessa ponte simbólica que liga o fora e o dentro, a rua e o silêncio, e tento aprender com os atravessamentos que ela provoca em mim e na minha forma de escrever.
Serei bem clichê agora, mas qual a sensação de receber um prêmio desse tamanho? Você chegou um dia a imaginar?
A minha primeira sensação ao receber o prêmio foi de alívio. E, sinceramente, seria essa mesma a sensação se eu não tivesse sido premiado. Confesso que cheguei a ter pesadelos com essa premiação. Eu não gosto desse ambiente de competição entre obras literárias, acho que a literatura não combina com isso. Se dependesse de mim, proporia outro formato de celebração do livro: algo mais próximo de um sarau, de uma festa literária, de um encontro em que as pessoas pudessem partilhar o que escrevem e o que as move a escrever. 
Entretanto, considerando o que representa o Prêmio Jabuti, a segunda sensação foi de contentamento, por perceber o reconhecimento que Maracujá Interrompida alcançou. Eu realmente não tinha como imaginar isso. Primeiro, porque nem cogitava concorrer ao Prêmio Hermilo Borba Filho. Foi a opinião sincera de uma amiga, Lia, que me encorajou a inscrever o livro. Depois veio o resultado, e me senti honrado por poder representar o sertão. 
Aproveitando que essa entrevista deve sair no Dia Nacional do Livro, o que você tem lido? Quais indicações daria aos seus leitores?
Tenho lido com muita calma dois livros: um de poesia, O Jardim das Oliveiras, de Adélia Prado, e um romance, Escalavra, de Marcelino Freire. Indico todas as obras de Adélia e Marcelino, dois autores que, cada um a seu modo, representam de forma exemplar o verso e a prosa da literatura contemporânea brasileira. Se fosse para ampliar a lista, faltariam caracteres. Vivemos um momento especialmente fértil da nossa literatura, com escritores e escritoras incríveis espalhados por todo o país.
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