Notas sobre canções de amor, identidades e outras coisas que ouvi no Festival do Edésio Santos

by - dezembro 13, 2020

 Evento premiou as melhores canções autorais da região

| Gean Ramos foi o grande destaque da noite | Foto: Ascom PMJ |

A noite de sábado (12) foi de comunhão para a cena musical da região. Os encontros que se fazem possíveis ao redor de um festival, instrumento pulsante para Cultura, foram reafirmados durante a final do Festival Edésio Santos da Canção e precisamos celebrar a sobrevivência de um projeto que chega a sua 23ª edição, mesmo tendo que se adaptar à realidade de 2020. O encerramento contou com a apresentação das músicas finalistas e um show especial de Almério, no Teatro Wellington Monteclaro, que fica no bairro Tabuleiro de Juazeiro-BA.

No espaço, era notável a organização com ações de prevenção à Covid-19, seguindo os protocolos de distanciamento e distribuição de álcool, claro que ainda se depende da consciência das pessoas para que tudo continue funcionando. O camarim foi montado na quadra, com mesas separadas, ali assisti o começo da transmissão feita para o Youtube (ainda é possível assistir aqui). Importante pontuar que falarei impressões de alguém que admira a Música, mas não a domina.

O primeiro a se apresentar foi Dom Pilé cantando ‘Mundo A Fora’ de Nelson Luiz Leal Gusmão. Pilé é um dos cantores mais expressivos da região, que aproveita todos os cantos do palco. A música mexe com todo mundo que goste de um forró para arrastar o pé, citando “a asa branca que foi embora pra despedida do sertão”. Em seguida, Gean Ramos subiu ao palco para defender ‘O Tempo do Amor’ de Eugênio Cruz. Uma música que fala com sinceridade sobre se entregar, como diz a música “se é cafona ou demodê falar de amor, eu prefiro ser cafona do que sofrer”. Falar de Gean Ramos como intérprete é fácil, escutar ele cantar sempre é bom, um jeito só dele de tocar e interpretando essa música ainda melhor com um ganho de expressividade.

“O amor precisa de cura não”, esse é o grito que Allan Carlos traz em sua música ‘We Will Survive'. Os elementos de rock deram uma clara levantada no público e o cantor, primeiro a defender sua autoria, estava forte em sua mensagem contra racismo e homofobia. A quarta música foi ‘Dilema’ de Noel Ferrari Normanha e interpretada por Nega Dell. A ver cantar sempre é algo energizante, ela tem uma voz que ecoa e que preenche o espaço com potência.

| Nega Dell e sua força | Foto: Ascom PMJ |

Elder Ferrari subiu ao palco acompanhado da Banda Erva Doce para defender sua criação ‘Voe!’. A música tem uma boa batida, com gingada. Elder traz para apresentação suas experiências teatrais, ele canta com uma energia de quem domina essa função. Em seguida, foi a vez de Joyce Guirra trazer seu ‘Canto em Pranto’. De sua autoria, a música é envolvente e bem ritmada, dá vontade de dançar e sofrer um pouco escutando ela. Sobre a força vocal de Joyce não há nem o que falar, uma voz pra escutar muito e uma expressividade que só ela tem.

Rodando bolsinha e com uma forte crítica a imagem que a sociedade constrói sobre a figura da travesti, Killaeua entrou para cantar ‘Travessia’. O rap que ela traz vomita realidades no público, pois ela “atravessou o rio de lágrimas que precisava” e agora tem muito o que dizer. Ver uma mulher trans no palco deste festival é no mínimo significativo, ela ainda está no começo da carreira, mas tem o que é preciso. Depois de uma batida de DJ, chegou a vez de se entregar ao doce de Dayanne Menezes, que escreveu e defendeu ‘Flor de Lótus’. A canção fala de dançarina e sim, é como se levasse a gente para bailar pelo quarto que descreve.

Gean Ramos voltou para defender uma criação sua, ‘Se Urú Obaí (Da Minha Boca Sai Fogo)’. Com as armas de seus ancestrais, ele canta sua territorialidade e pertencimento. "Nós vamos resistir, lutar até a última chuva", assim faz um pedido de paz e exige justiça pelos nossos povos originários, afinal esse país não foi descoberto em 1.500. A próxima a cantar foi Isis Nascimento, defendendo ‘Se Por Acaso Ela Tiver’ de Nally Maria e Ivan Greg. “Ame, permaneça e não se acanhe” com esse tom de magia que trouxeram os efeitos sonoros das musicistas convidadas e a intérprete com uma voz suave. 

Rodrigo Leal cantou ‘Onde Tudo Começa’ de Keréto, que lembra aquela hora que alguém sorri com os olhos e momentos de borboletas na barriga. A última canção foi ‘Arame Farpado’ de Gutemberg Vieira e Sérgio Silva, interpretada por Lailane Coutinho. Acompanhada de dois violões, traz uma música tocante e com tons de regionalidade.

| Dayanne Menezes recebeu dois prêmios da noite | Foto: Ascom PMJ |

Além de parabenizar todos os artistas por sua coragem de expor ao público suas criações inéditas e serem julgados, esse despir tão significativo a nós artistas, também preciso destacar a organização do projeto, realizado pela Prefeitura Municipal de Juazeiro, através da Secretaria de Cultura. Em um ano já muito diferente do habitual, eles conseguiram realizar um festival organizado e respeitoso com a classe artística, muito provavelmente por ter a frente um cantor que tanto já se apresentou nesse formato. Allan Cleber, que foi o primeiro a ganhar melhor intérprete no Edésio, hoje secretário de Cultura se revelou um bom gestor cultural que arregaça as mangas para que tudo dê certo, era nítido que ele estava imerso na ação.

Almério - Após uma noite com intérpretes que chamavam tanta atenção pela expressividade, o show de Almério era a pedida certa. O cantor pernambucano traz muito de identidade para suas canções e muitos autores de todo o estado para seu repertório. Ele “aquece o coração de papai” como diz, músicas dançantes e que fazem pensar questões da comunidade LGBTQIA+. Em uma de suas falas durante suas apresentações, também reafirmou a necessidade de espaços como esse do “Edésio”, que valoriza as criações e canções inéditas.

Prêmios - O anúncio dos vencedores da edição foi feito ainda durante a transmissão, a melhor canção pelo júri oficial foi ‘Se Urú Obaí’ de Gean Ramos. O segundo lugar ficou com ‘Tempo de Amor’ de Eugênio Cruz e o terceiro com ‘Flor de Lótus’ de Dayanne Menezes, que também foi escolhida como melhor canção pelo júri popular. A premiada como melhor intérprete da noite foi Joyce Guirra. 



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